"Naipe de besoiros"
1965
1965
Francisco Viana
Gostar de ti,
é caminhar ruas desertas;
ouvir bater horas perdidas;
continuar de mãos abertas
como folhas pelo vento desprendidas.
Gostar de ti,
é sentir o esvoaçar em derredor,
a todo o instante, duma sombra alucinada;
e escorrer entre os dedos da noite prolongada
um largo anseio, cada vez maior.
Gostar de ti,
é olhar a noite de negrume e solidão
onde uma luz surgiu e logo se findou
e ficar com os olhos cheios de escuridão
julgando ter ainda a luz que se apagou.
Gostar de ti,
é despertar dum sonho angustiante
de gelados ventos fustigando a carne nua;
procurar em volta, um calor distante,
e sentir afinal que o sonho continua.
Gostar de ti, amor,
é esta miragem deslumbrada
de estar perto de tudo
e não ter nada.
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